Comunicação indígena será decisiva para enfrentar mudanças climáticas em 2025
Capazes de conectar saberes ancestrais e práticas decisivas para a preservação da floresta, comunicadores indígenas terão papel crucial nos espaços de decisão a respeito do clima
Enquanto o mundo assiste a eventos climáticos cada vez mais extremos – como as secas históricas que assolaram a Amazônia em 2023 e 2024, e o sul do país com chuvas torrenciais que inundaram várias cidades no Rio Grande do Sul em maio passado, uma pergunta ecoa: como enfrentaremos a crise climática global? No coração dessa resposta estão os indígenas. Em 2025, os povos originários terão muito a ensinar sobre como enfrentar um fenômeno que já afeta milhares de vidas no planeta.
Na bacia do Rio Negro, localizada no extremo noroeste do estado do Amazonas, onde vivem 23 povos indígenas, comunidades que habitam a região há milhares de anos enfrentam tanto as cheias recordes quanto secas prolongadas que desafiam sua sobrevivência. Foi que aconteceu em 2023, quando a navegabilidade dos rios foi afetada pela seca histórica, dificuldade o acesso à roça, de onde tiram o seu principal alimento, a mandioca. Essas populações dependem da floresta e dos rios para viver. Mudanças no ciclo das chuvas afetam a dinâmica e comportamento dos peixes, das minhocas e até a fertilidade do solo. Esses impactos não são meramente "dados" para os povos indígenas: são vivências que alteram profundamente suas práticas de subsistência, rituais e a sua relação com a natureza.
Nessa região, desde 2005, quem tem feito esses registros são os Agentes Indígenas de Manejo Ambiental, uma iniciativa da Federação das Organizações Indígenas do Rio Negro (FOIRN) em parceria com o Instituto Socioambiental (ISA). Os resultados dessas pesquisas são publicados em uma revista chamada Aru, que está em sua quarta edição, disponível na internet e também circulando no formato impresso na região.
Mesmo diante dos desafios apresentados pelas mudanças climáticas, os modos de vida tradicionais dos povos indígenas oferecem um farol em meio à crise. Com práticas sustentáveis, como o manejo agroflorestal e o uso de técnicas de pesca e roçado que respeitam os ciclos naturais, essas comunidades demonstram que é possível viver em harmonia com a natureza – eles preferem afirmar que são partes da própria natureza e da terra mãe, por isso, há tanto cuidado e respeito com ela.
As técnicas parecem simples, mas carregam uma sofisticação baseada em milhares anos de observação e interação direta com a natureza – um conhecimento que os cientistas recém começam a reconhecer como essencial no enfrentamento das mudanças climáticas. Isso é comprovado por vários estudos, que deixam claro que os territórios indígenas são os mais preservados no Brasil.
Porém, os povos indígenas, guardiões das florestas, sofrem ataques aos seus direitos e garantias constitucionais todos os dias, seja no Executivo, no Legislativo e Judiciário. Por isso a necessidade de uma mobilização permanente e de luta por essas conquistas.
Em um cenário de mobilização e de luta, a comunicação tem um papel crucial. É aqui que entra a Rede de Comunicadores Indígenas do Rio Negro, a Rede Wayuri. Criada em 2017 para fortalecer as narrativas dos povos indígenas, a rede utiliza podcasts, redes sociais e materiais educativos para divulgar informações que combinam saberes tradicionais e práticas contemporâneas. Além de alertar sobre os impactos das mudanças climáticas, a Wayuri valoriza e compartilha estratégias indígenas de adaptação, aproximando os povos da região e levando suas vozes ao mundo.
A Rede Wayuri também age como um radar, registrando os efeitos das mudanças climáticas em territórios indígenas e mobilizando comunidades para agir. Um exemplo é o trabalho realizado para documentar cheias e secas extremas, que não apenas informam os próprios indígenas, mas também ajudam a alertar a sociedade sobre a gravidade da crise. É a prova viva de que os povos indígenas não são apenas vítimas das mudanças climáticas, mas protagonistas na luta por soluções.
Enquanto o planeta busca saídas para a crise em reuniões e eventos como as COPs, os saberes indígenas e a comunicação comunitária se mostram ferramentas indispensáveis. Reconhecer isso não é apenas um ato de justiça histórica, mas também uma estratégia urgente para salvar o futuro de todos. Como a floresta, os rios e as comunidades que nela vivem nos mostram, é preciso conectar saberes, práticas e vozes em uma verdadeira teia de soluções climáticas.
Em 2025, a tendência é que a comunicação popular, as redes comunitárias ocupem os espaços de decisão a respeito do clima, para poder comunicar aos povos da floresta o que se tem proposto para salvar o planeta, pois somos nós que estamos a segurar essa panela de pressão do aquecimento global.
Este texto faz parte da série O Jornalismo no Brasil em 2025. A opinião dos autores não necessariamente representa a opinião da Abraji ou do Farol Jornalismo.