NFJ#501 🍂 Atuar junto de comunidades pode melhorar cobertura de justiça climática
Fundo de Apoio ao Jornalismo (FAJ) é lançado no ISOJ | Como recuperar a confiança em tempos de credibilidade em declínio | Buscas de IA geram pouco tráfego para produtores de notícias
Hola!
Moreno aqui, no dia 4785 de março.
Tá rolando ontem e hoje em Austin, no Texas, a 26º edição do Simpósio Internacional de Jornalismo Online (ISOJ). Nesta e na próxima semana vamos contar um pouco do que vimos (tá rolando transmissão, infelizmente não estamos lá) do evento. Hoje eu conto como foi um painel sobre como recuperar a confiança do público e a Lívia detalha a mesa sobre financiamento do jornalismo, que abriu o simpósio e trouxe uma novidade para o ecossistema jornalístico brasileiro: o lançamento do Fundo de Apoio ao Jornalismo (FAJ). Na próxima edição seguiremos falando de financiamento e de outros tópicos quentes que rolaram no ISOJ, como IA.
Hoje estamos todos: eu (MO), Lívia (LV) e Giuliander (GC).
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Nosso agradecimento de <3 vai para:
Adriana Martorano Vieira, Alexandre Galante, Amaralina Machado Rodrigues Xavier, André Caramante, Andrei Rossetto, Ariane Camilo Pinheiro Alves, Ben Hur Demeneck, Bernardete Melo de Cruz, Bibiana Osório, Bruno Souza de Araujo, Diogo Rodrigues Pinheiro, Edimilson do Amaral Donini, Fabiana Moraes, FêCris Vasconcellos, Filipe Techera, Gabriela Favre, Guilherme Nagamine, João Vicente Ribas, Jonas Gonçalves da Silva, Marcela Duarte, Marco Túlio Pires, Mateus Netzel, Milena Giacomini, Monica de Sousa França, Nadia Leal, Pedro Luiz da Silveira Osório, Priscila dos Santos Pacheco, Rafael Paes Henriques, Roberto Nogueira Gerosa, Roberto Villar Belmonte, Rodrigo Ghedin, Rodrigo Muzell, Rogerio Christofoletti Rosental C Alves, Sérgio Lüdtke, Silvio Sodré, Suzana Oliveira Barbosa, Taís Seibt, Vinicius Luiz Tondolo, Vitor Hugo Brandalise, Washington José de Souza Filho.
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🍂 Notícias do ISOJ I: filantropia e jornalismo. O primeiro painel do ISOJ 2025 foi direto a um dos assuntos mais importantes para a indústria jornalística atual: como criar fundos para financiar o jornalismo. O foco foi a filantropia e, antes que vocês digam que isso não é muito comum no Brasil, Carolina Oms anunciou, em primeira mão, a criação do Fundo de Apoio ao Jornalismo (FAJ) no nosso país. Mas vamos do começo, porque dedicamos um bloco só pra isso. O mediador Jim Brady, vice-presidente da Fundação Knight, iniciou a mesa dizendo que, na maior parte dos últimos 30 anos, o jornalismo local não precisou de auxílio financeiro algum. Localizada nos últimos 15 anos, a crise do jornalismo transformou o papel da filantropia, elevando-o não só nos EUA, mas também no mundo. Segundo ele, não é bom que as organizações precisem da filantropia pra sempre, mas ela tem um papel fundamental agora. Sarabeth Berman, CEO do American Journalism Project (AJP), explicou como a entidade tem apoiado 50 veículos sem fins lucrativos em 36 estados norte-americanos. O foco é reimaginar o modelo de negócios do jornalismo local. Para ela, o declínio das notícias locais teme consequências na vida real: o engajamento cívico diminuiu, o gasto governamental cresceu e a polarização se intensificou. Desta forma, não se trata somente de uma falência de marketing, pois as notícias locais precisam ser consideradas como um bem público. E mostrou números que mostram que estão num caminho profícuo. Na mesma linha, Vanina Berghella, do International Fund for Public Interest Media, centrou sua fala nos países do Sul Global; e Dale Anglin, da Press Forward, também enfatizou o financiamento no jornalismo local. Para nós, interessou mais a fala de Carolina Oms, diretora do recém-criado Fundo de Apoio ao Jornalismo (FAJ) e cofundadora de AzMina. Open Society, International Fund for Public Interest Media, Fundação Ford, Luminate e Oak Foundation estão por traz do FAJ. Ela salientou a inovação e coragem dos veículos nativos digitais brasileiros, mas afirmou que a filantropia representa apenas 0,5% do investimento no jornalismo do Brasil. “Todo mundo faz tudo, inclusive captar financiamentos”, resumiu, referindo-se à realidade do jornalismo digital no país. Um dos problemas da filantropia é, para ela, sua curta duração. Os projetos financiados não passam de um ano, em sua maioria, o que o FAJ pretende corrigir, financiando organizações por até três anos. Outros objetivos são a diversidade de regiões, a transparência na distribuição dos fundos e o treinamento das iniciativas apoiadas. Isso nos leva ao próximo bloco, no qual detalhamos como vai funcionar esse primeiro aporte do FAJ. (LV)
🍂 Apoio financeiro para o jornalismo local brasileiro. Enquanto Caroina Oms falava no ISOJ, era lançado o Fundo de Apoio ao Jornalismo (FAJ), iniciativa independente com o objetivo de fortalecer o jornalismo local no Brasil. O edital está aberto e as inscrições vão até 27 de maio. Serão selecionadas até 15 organizações regionais, priorizando veículos que atuam em municípios sem cobertura jornalística ativa, os chamados "desertos de notícias". Cada projeto poderá receber entre R$ 75 mil e R$ 150 mil por ano, durante três anos consecutivos. Segundo destacou esta matéria do Poder 360, o financiamento cobrirá desde infraestrutura operacional até capacitação de profissionais. “O fundo começou a ser construído em 2022, fruto de uma articulação entre a Associação de Jornalismo Digital (Ajor), as fundações que participam dessa fase inicial e algumas organizações de jornalismo, demonstrando um compromisso coletivo de longo prazo com a sustentabilidade do jornalismo independente no país”, informa o site do FAJ. Uma das etapas que Carolina Oms mencionou em sua fala no ISOJ foi uma survey, que deu origem ao relatório “Descentralizar, ampliar e aprofundar: o financiamento do jornalismo no Brasil”. Vamos detalhar os achados desta survey na semana que vem, mas aqui vai um spoiler: a estratégia do FAJ está focada em descentralizar o financiamento, de maneira contínua, com o complemento de mentoria e fortalecimento organizacional. “Buscamos priorizar iniciativas lideradas por mulheres, pessoas negras, indígenas, quilombolas, LGBTQPIA+, e/ou inseridas em condições de desigualdades, que não apenas produzam conteúdo de qualidade, mas que também contribuam para a diversificação e pluralidade do cenário jornalístico brasileiro”, esclarece o edital. (LV)
🍂 Notícias do ISOJ II: como recuperar a confiança em tempos de credibilidade em declínio. Este foi o tema do segundo painel do primeiro dia e, olha, já vou dizer que tem muito a ver com a análise desta semana (exclusiva para apoiadores), sobre como melhorar a cobertura ambiental a partir de uma abordagem community-based. O link entre uma coisa e outra é o resumo, diria eu, da conversa entre Sally Lehrman, fundadora e CEO do The Trust Project, Joy Mayer, fundadora e diretora executiva do Trusting News, e Stephen Buckley, ombudsman (public editor) do The Dallas Morning News. Mediados por Michael Bolden, CEO e diretor executivo do American Press Institute (API), os três falaram muito da necessidade de o jornalismo se envolver com suas comunidades como o movimento-chave para recuperar a confiança das pessoas. Como a gente sabe, esse movimento não é simples, e envolve dedicação a outros valores que nem sempre a gente dá a devida atenção, como transparência e humildade. Achei o debate em torno da humildade bem interessante. Podemos falar do básico, por exemplo, a importância de elaborar uma política de correção de erros (e de fato corrigi-los). Mas também significa descer do pedestal e se colocar junto das pessoas. O jornalismo precisa parar de jogar informação no público. As pessoas estão cansadas, afirmou Lehrman. “Elas querem ser parte da equação.” Ser humilde significa também estar atento ao próprio trabalho e demonstrar cuidado para com suas fontes. Buckley lembrou de um episódio em que jornalistas mandaram um buquê de flores para uma família que havia concedido uma entrevista a eles logo depois da perda de um de seus membros em uma tragédia. “Foi uma forma de dizer: ‘nós nos importamos com a sua tristeza’”, disse. Outro ponto que norteou o painel foi a necessidade de pararmos de achar que as pessoas sabem como a gente trabalha. “As pessoas não sabem o que conversamos dentro da redação, não sabem o que é bem público. O jornalismo não investe nesses entendimentos. É preciso deixar esses processos mais claros”, afirmou Mayer. Mas não basta boa vontade dos jornalistas, essas iniciativas devem ser institucionalizadas, acrescentou Lehrman. Por fim, Buckley lembrou de algo que muitas vezes a gente se esquece: o público não é nosso inimigo, e a gente está a serviço dele. “Por isso”, disse o ombudsman, acostumado a fazer um ponte entre a redação e a comunidade a qual ela serve, “às vezes é bom deixar o público ter a última palavra”. No fim, as pessoas só querem ser ouvidas, e agradecem por isso. (MO)
🍂 Buscas de IA geram pouquíssimo tráfego para produtores de notícias. Depois de alguns meses de atualizações mais intensas das funções de busca de ferramentas de IA como ChatGPT, Perplexity e Google, agora temos dados sobre o redirecionamento delas para o conteúdo original que as alimenta. E, segundo um levantamento da ComScore analisado pelo Generative AI In The Newsroom em duas partes, a conclusão é a esperada pela indústria: essas ferramentas quase não direcionam tráfego para sites de notícias.
A primeira parte dos dados continha, depois de filtrados, 145.065 visitas a ChatGPT e Perplexity (106.435 ao primeiro; 38.630 ao segundo) feitas por 23.118 usuários únicos (19.876 do ChatGPT; 3.977 de Perplexity) em um período de cinco meses. Revistas e editoras acadêmicas são a categoria de referência mais importante para ambos os serviços, segundo esses dados, com cerca de 16% do tráfego do ChatGPT e 22% de Perplexity sendo enviado para essas fontes. “Ambos os serviços parecem tirar vantagem de recursos científicos de acesso aberto, como PubMed, Semantic Scholar e ResearchGate, e esses tipos de links são frequentemente seguidos pelos usuários, sugerindo um interesse em ver os detalhes dessas fontes”, escrevem Nick Hagar e Nick Diakopoulos, pesquisadores da Northwestern University (Chicago).
Quantas dessas visitas foram redirecionadas para veículos de comunicação? Vou deixar os pesquisadores contarem isso para vocês:
“Apenas 3,2% do tráfego filtrado do ChatGPT (7% de usuários únicos — aproximadamente 1.400 de 20.000) e 7,4% do tráfego filtrado do Perplexity (21% de usuários únicos — aproximadamente 800 de 4.000). Entre os 143 sites de notícias em nossa amostra, apenas 5 receberam 100 ou mais visitantes únicos durante o período de cinco meses. Ao comparar o Perplexity e o ChatGPT, as notícias parecem ser mais impulsionadas pelo Perplexity, onde estão classificadas como a 3ª maior categoria. O Perplexity vinculou-se a 110 fontes de notícias únicas em comparação com as 69 do ChatGPT, e apenas 37 delas se sobrepuseram entre as duas, indicando que cada serviço é bastante distinto nas fontes de notícias às quais se refere.”
Os pesquisadores também analisaram URLs que resultaram em erros 404 (página não encontrada), importantes por serem possíveis alucinações dos modelos. Havia apenas 21 dessas URLs nos dados de Perplexity, mas significativas 205 nos dados do ChatGPT, quase todas relacionadas a importantes meios de comunicação como o NY Times e o Guardian. Os indícios de alucinação são mesmo fortes:
“Primeiro, nenhuma das URLs para esses cinco sites de notícias está arquivada na Wayback Machine, o que é incomum para grandes veículos de notícias. Segundo, a revisão manual de casos individuais revela URLs que não parecem corresponder a nenhuma história ao vivo nesses sites”.
Opa. (GC)
🍂 Parcerias fazem pouco sentido em termos de redirecionamento de tráfego. A segunda parte da análise examina como a expansão do IA Overviews do Google impacta o tráfego e como as decisões dos publishers relacionadas à OpenAI (bloqueios, parcerias ou processos exigindo pagamento de direitos autorais) têm afetado o redirecionamento pelo ChatGPT. Para este estudo, a amostra continha 152.700 visitas de 14.703 usuários únicos a 10 sites de notícias americanos (Associated Press, The Atlantic, CNN, Fox News, The New York Times, Politico, Time, USA Today, The Wall Street Journal e The Washington Post).
A primeira conclusão é que o IA Overviews não teve impacto significativo no tráfego dos publishers. “Essa descoberta sugere que, apesar do aumento da saliência de links e acessibilidade no AI Overviews, eles não impulsionaram nem canibalizaram o tráfego de referência do Google para sites de notícias em relação a outras fontes. Para os editores preocupados com os resumos de IA redirecionando os usuários para longe de seu conteúdo, isso representa uma notícia cautelosamente boa — pelo menos por enquanto”, afirmaram os autores.
Em segundo lugar, a política de evitar que os crawlers do ChatGPT usem o material dos publishers não tem afetado o redirecionamento de tráfego da ferramenta. E, por fim, firmar uma parceria formal com a OpenAI praticamente não teve efeito na quantidade de tráfego que os veículos de notícias receberam da plataforma. O que levou os pesquisadores a escrever que:
“Isso levanta questões importantes para os publishers que consideram tais parcerias. Embora esses acordos possam fornecer outros benefícios — como compensação pelo uso do conteúdo ou influência sobre como o conteúdo é representado — eles não parecem criar novos caminhos de tráfego significativos de volta aos sites de notícias. Isso sugere que o comportamento do usuário com o ChatGPT Search pode ser diferente dos mecanismos de busca tradicionais, com os usuários potencialmente visualizando o resumo de IA como suficiente em vez de clicar nas fontes originais, independentemente de essas fontes terem relacionamentos formais com a OpenAI.”
(GC)
💎 Como cobrir mudanças climáticas a partir de um jornalismo community-based. Cobrir clima não é fácil. Com a grana minguando, a vaca do jornalismo local foi pro brejo (recentemente estamos tentando puxá-la de lá, mas tá difícil). Com ela, a confiança das pessoas. Consequentemente, a cobertura de assuntos relacionados ao meio ambiente – considerada uma subárea do jornalismo local e tradicionalmente vista como zero clique pela mídia comercial – foi ainda mais prejudicada. A catástrofe climática abriu ainda mais essa ferida, expondo a necessidade de o jornalismo abordar o assunto transversalmente e acelerar mudanças dentro de seus próprios métodos e processos para conseguir dar conta da urgência da situação.
A análise de hoje vai dissecar um estudo publicado na Journalism Practice sobre como o jornalismo centrado em comunidades pode melhorar a cobertura de justiça climática em comunidades subrrepresentadas. O foco do paper, que tem a autoria de pesquisadores da Universidade do Michigan, foi a região dos Grande Lagos, nos EUA, mas os resultados podem ser facilmente usados como insights para coberturas similares em outros lugares – inclusive aqui no Brasil. Depois de 42 entrevistar líderes locais, representantes de mídias especializadas, especialistas e financiadores, os autores fizeram uma série de recomendações. Um spoiler: a gente vai ter que se envolver. Apoiadores seguem com a gente.
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