NFJ#488 🌱 Volta de Trump escancara limitação da influência da mídia tradicional
Guardian deixa o Twitter/X: "plataforma tóxica" | Na UE, Google vai remover notícias de resultados de pesquisa | Dicas para cobrir o clima | Pequenos experimentos sobre o consumo de notícias 💎
Oi, gente, como estão? Curtindo o feriadão? Lívia aqui. Em Salvador, temos uma manhã de sexta-feira ensolarada, um convite pra sair de casa e aproveitar a cidade. É o que pretendo fazer daqui a pouco, quando vocês estiverem lendo isso. Por enquanto, fico com meu vinho, Jamie Cullum na Alexa e linhas a escrever.
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No fim da newsletter há um diamante (💎). Hoje eu mergulho em dois relatos bastante pessoais de dois jornalistas, pequenos experimentos relacionados ao hábito de consumo de notícias. Sou suspeita, mas estão bem interessantes e nos convidam mesmo à reflexão. Um spooiler: “Ela percebeu que as [notícias] ruins a faziam ter reações desproprocionais de irritação com as crianças e as boas a levavam a ignorar os filhos”. Exclusivo para apoiadores aqui e no Apoia-se.
Hoje estamos eu (LV), Moreno (MO) e o Giuliander (GC).
Bora!
Nosso agradecimento de <3 vai para:
Adriana Martorano Vieira, Alexandre Galante, Amaralina Machado Rodrigues Xavier, André Caramante, Andrei Rossetto, Antônio Laranjeira, Antonio Simões Menezes, Ariane Camilo Pinheiro Alves, Ben Hur Demeneck, Bernardete Melo de Cruz, Bibiana Osório, Bruno Souza de Araujo, Carlos Alberto Silva, Diogo Rodrigues Pinheiro, Edimilson do Amaral Donini, Fabiana Moraes, FêCris Vasconcellos, Filipe Techera, Gabriela Favre, Guilherme Nagamine, João Vicente Ribas, Jonas Gonçalves da Silva, Marcela Duarte, Marco Túlio Pires, Mateus Netzel, Milena Giacomini, Monica de Sousa França, Nadia Leal, Pedro Luiz da Silveira Osório, Priscila dos Santos Pacheco, Rafael Paes Henriques, Roberto Nogueira Gerosa, Roberto Villar Belmonte, Rodrigo Ghedin, Rodrigo Muzell, Rogerio Christofoletti, Rose Angélica do Nascimento, Rosental C Alves, Sérgio Lüdtke, Silvio Sodré, Suzana Oliveira Barbosa, Taís Seibt, Vinicius Luiz Tondolo, Vitor Hugo Brandalise, Washington José de Souza Filho.
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🌱 A velha mídia luta com seus novos limites. Ainda no rastro das Eleições nos EUA, têm saído algumas análises bem interessantes sobre o estado atual do jornalismo. No Semafor, Max Tani discorda das críticas de que a imprensa estadunidense não fez o suficiente para comunicar a retórica autoritária de Trump ou "não percebeu" a ascensão da ala direita da tecnologia. Ele lembra que os principais veículos levaram o agora presidente a sério, fizeram cobertura diária de seus impulsos fascistas e das relações com Elon Musk, podcasters e outros. Para Tani, a verdade é muito mais desconfortável: “a mídia tradicional está mais limitada em seu alcance e influência do que nunca na era moderna”. E segue:
“Pela terceira disputa presidencial consecutiva, a mídia tradicional – representada por jornais, redes de televisão, revistas e redes de notícias a cabo – passou meses publicando e transmitindo coberturas de notícias esmagadoramente negativas sobre o ex-presidente. E pela segunda dessas três vezes, a maioria dos eleitores americanos ignorou amplamente os avisos implícitos e explícitos dessa cobertura – se é que o viram – e votaram em Trump para o cargo”.
Charlie Warzel enumera, na The Atlantic, os elementos dessa crise: confiança em declínio, economia ruim, pressão política, capitalistas abutres, ascensão da internet e decisões de cobertura que alienaram ou enfureceram parte do público. “Cada uma dessas coisas afetou como os americanos vivenciaram essa eleição, embora seja impossível dizer qual é o impacto no todo. Se ‘você é a mídia’ [em referência ao tuíte de Elon Musk logo após o pleito], então não há mais uma realidade consensual informada pelo que o público vê e ouve: cada um escolhe sua própria aventura”, afirma.
Mas será que a vitória de Trump pode ter pelo menos um efeito positivo – um novo “Trump bump”? Esta matéria do Press Gazette informa que houve um aumento nos preços das ações de várias empresas de notícias de capital aberto. No entanto, o mais provável é que a causa seja “a crença dos investidores de que os cortes de impostos previstos por Trump beneficiarão o desempenho empresarial dos Estados Unidos, incluindo empresas de notícias”. Este texto do Digiday observa que as organizações de notícias não tiveram um aumento no tráfego na semana da eleição presidencial de 2024, como aconteceu em 2020, em parte devido à rápida revelação do vencedor. (LV)
🌱 Debandada do Twitter-X e uma má notícia. Esta semana, pelo menos dois grandes veículos jornalísticos anunciaram o fim de publicações na rede social de Elon Musk – que, aliás, ganhou um cargo no governo Trump. O Guardian, que tem mais de 80 contas no X com 27 milhões de seguidores, argumenta que os benefícios de estar na plataforma agora são menores que os aspectos negativos. “A campanha eleitoral dos EUA serviu apenas para sublinhar o que consideramos há muito tempo: que o X é uma plataforma de mídia tóxica e que seu proprietário, Elon Musk, conseguiu usar sua influência para moldar o discurso político”, diz o comunicado aos leitores. Este texto do Nieman Lab informa que, por enquanto, o jornal inglês não vai deletar as contas existentes. Na mesma linha, o espanhol La Vanguardia afirma que o X se converteu em uma rede de desinformação e de teorias da conspiração. “Este jornal avalia que ideias que violam os direitos humanos, como o ódio às minorias étnicas, a misoginia e o racismo fazem parte do conteúdo viral que é distribuído no X e captam mais tempo dos usuários, com o intuito de ganhar mais dinheiro com inserções publicitárias”, destaca a redação. Tudo indica que a debandada – que não foi só dos veículos jornalísticos – teve como destino o Blue Sky, que ganhou 1 milhão de novos usuários após as Eleições nos EUA. Adam Tinworth afirma que os jornalistas estão preferindo o Blue Sky ao Threads, já que a Meta faz questão de não enxergar sua rede como uma plataforma de notícias. “Sempre pensei que jornalistas e políticos seriam os últimos a sobrar, já que o Twitter ainda gerava engajamento. Mas talvez eu esteja errado. Jornalistas estão começando a ir embora…”, diz.
E nesse jogo de tensões entre jornalismo e plataformas, mais uma notícia preocupante: o Google anunciou que vai remover notícias de seus resultados de pesquisa em alguns países da União Europeia por tempo determinado. Esta matéria do The Verge explica que o “teste” é uma resposta a solicitações de dados adicionais dos reguladores da UE (nada muito claro, né?). Mas a matéria vai no ponto ao observar que o experimento mais parece um aviso. “Ao final do teste, os publishers da UE verão exatamente quanto tráfego estariam perdendo sem o Google enquanto esse, por sua vez, teria alguma percepção sobre o quanto seus usuários realmente se importam com notícias”, diz o texto. O Facebook fez isso no passado e acabou por remover a aba “Notícias” e por parar de pagar os publishers pelo Instant Articles. (LV)
🌱 Dicas para cobrir as mudanças climáticas. Talvez vocês assinem a newsletter do Instituto Reuters. Se não, talvez devessem. A dessa semana tá bem interessante. Usa como gancho a COP29, que tá rolando em Baku, no Azerbaijão – terra natal do Kasparov (ns), para falar dar dicas de como o jornalismo pode melhorar a cobertura das mudanças climáticas. A edição é inteiramente dedicada ao tema e foi editada pelo Oxford Climate Journalism Network (OCJN). Vou passar os olhos por alguns destaques. O primeiro é um trecho de uma ping com Leo Hickman, editor do Carbon Brief, veículo britânico especializado no assunto. Vejam o que ele disse sobre ampliar o escopo da cobertura para além das decisões da conferência.
“Precisamos encontrar maneiras de explicar e ilustrar as implicações dos resultados da COP em áreas tangíveis da vida real, como agricultura, transporte e indústria pesada, muitas vezes por meio de impactos indiretos e posteriores em políticas e decisões de negócios/investidores. Portanto, as COPs podem produzir uma variedade de materiais para histórias durante todo o ano. A chave é pensar em como os resultados podem repercutir em nossas vidas cotidianas como consumidores, eleitores e cidadãos que estão cada vez mais vulneráveis aos impactos do clima extremo.”
Boa, hein.
Dialoga com a sugestão que Giovana Girardi deu na edição 2023/24 d’O jornalismo no Brasil. Mas como colocar as questões climáticas no dia a dia da cobertura? A news do Reuters traz um exemplo de como a Bloomberg levou o clima a uma pauta de comportamento. Esta reportagem fala sobre os “Climate Dads”, pais “100% focados em salvar o planeta”. Olhem o que diz Olivia Rudgard, autora da matéria:
“Há milhões [de pessoas] mudando seu comportamento para viver com o clima em mente. Definir esses “nichos” climáticos significa que podemos trazer à tona as histórias por trás dessas mudanças, mostrando tanto as alegrias quanto os desafios de abrir novos caminhos. É uma maneira de mostrar ao leitor — em vez de contar a ele — como as coisas estão mudando, ao mesmo tempo em que produzimos histórias atraentes, cheias de caráter e cor.”
Pra fechar, salvem este banco de dados com mais de mil especialistas sobre clima no sul global. São especialistas de 103 países, que falam mais de 90 línguas. As informações foram compiladas pelo OCJN em parceria com o Carbon Brief. (MO)
🌱 Disputa sobre direitos autorais: IA 2 x 0 publishers. O primeiro round da disputa entre publishers e OpenAI na justiça a respeito de potencial violação de direitos autorais na utilização de conteúdo jornalístico para o treinamento de grandes modelos de linguagem (LLMs) foi vencido pela plataforma. Uma juíza de Nova York entendeu que não houve abuso da OpenAI nem dano concreto aos autores da ação, AlterNet e RawStory, no uso de seus conteúdos para melhorar os produtos de IA da empresa de tecnologia. Ela rejeitou completamente o pedido das publicações de esquerda, que ainda podem recorrer da decisão. A juíza afirmou que é remota a possibilidade de que o ChatGPT plagie conteúdo dos sites em seus resultados de pesquisa e considerou a ação uma forma dos publishers pressionarem a OpenAI para pagar uma compensação pelo uso de seu material. Existem cerca de 30 processos do gênero correndo na justiça americana. O mais emblemático deles talvez seja o do New York Times, que foi juntado com o pleito de oito publicações da Alden Global Capital, que publica, por exemplo, o New York Daily News. Os veículos estão atualmente vasculhando dados para encontrar instâncias de seu trabalho protegido por direitos autorais sendo usado para treinar os modelos da OpenAI – mas eles dizem que a empresa de tecnologia deveria ser forçada a fornecer as informações ela mesma. Essa disputa tende a ir longe. (GC)
🌱 Livros, lançamento e críticas.
Resultado de uma pesquisa de três anos envolvendo cientistas de todas as regiões do Brasil, o livro “Credibilidade jornalística”, organizado pelo professor Rogério Christofoletti, oferece contribuições teóricas, reflexivas e metodológicas para a busca de um jornalismo melhor e mais confiável. Baixe gratuitamente.
“Jornalismo, Tecnologia e Cibercultura: panoramas e debates” é o mais novo livro da Rede de Pesquisa Aplicada em Jornalismo e Tecnologias Digitais (JorTec). Organizado pelos professores Gerson Luiz Martins e Maíra de Sousa, a obra é um compilado de reflexões de disciplinas compartilhadas em nível de Pós-Graduação. Também disponível gratuitamente para download.
Seis meses após a trágica enchente no Rio Grande do Sul, as professoras Márcia Franz Amaral, Eloísa Beling Loose e Ilza Maria Tourinho Girardi lançam o “Manual para a Cobertura Jornalística dos Desastres Climáticos”. A live acontece no próximo dia 19, às 19h, quando o manual também será disponibilizado.
Vocês viram o artigo de Bolsonaro na Folha. Antes dele, contudo, o jornal “fatiou” em cinco pedaços uma entrevista com o ex-presidente, que gerou reclamação dos leitores e da ombudsman Alexandra Moraes. “O fatiamento de uma reportagem é uma via de mão dupla: se por um lado tem a tarefa pouco nobre mas importante de ‘render cliques’, por outro também pode facilitar a vida do leitor com textos menos longos e mais segmentados. Mas o veneno, como sempre, é o excesso. Picado demais, o material soa repetitivo ou incompleto”, diz.
“Golpe no estômago”, cravou o veterano jornalista Ricardo Kotscho, sobre o artigo de Bolsonaro. Para ele, “era necessário um editorial vigoroso que desmascarasse, ponto por ponto, as falácias do impostor que, há pouco tempo, buscava silenciar essa mesma imprensa antes mesmo de tomar posse”. (LV)
💎 Cansados das notícias. Esta semana selecionamos dois relatos bastante pessoais, que podemos chamar de pequenos experimentos relacionados ao hábito de consumo de notícias. Laura Owen, jornalista do Nieman Lab, conta como sua forma de obter notícias estava afetando seus relacionamentos e as estratégias que criou para mudar isso. Como mãe, me identifiquei bastante, porque um dos maiores impactos que ela sentiu foi no relacionamento com os filhos. O outro relato é do analista de mídia britânico Thomas Baekdal que, pela segunda vez, experimentou ficar um mês sem consumir notícias – e isso incluiu não saber nada sobre as Eleições nos EUA. Suas descobertas e interpretações nos ajudam a entender a perda de relevância do jornalismo e o que devemos fazer para tentar recuperá-la. (LV)
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