NFJ#516 ❄️ Guia rápido para se atualizar em IA
Mais de 90% dos leitores vão embora quando batem em paywall | O problema da confiança: o que nos resta são os indivíduos | 💎 Jornalismo zero: acordos de licenciamento | Cobertura política em chamas
Buenas tardes!
Apesar do horário, edição número 516 da NFJ foi fechada ao longo da manhã de uma sexta-feira cinza e fria em Porto Alegre. Quando ainda estava escuro, logo depois do guri ir pra escola, o café. Ao longo da manhã, o mate. Enquanto dedos deslizavam pelo teclado, um olho estava em Wimbledom, outro no Tour de France – mas já na expectativa pela final da Copa do Mundo, domingo. Your defence is terrified.
No mais, uma manhã de trabalho na redação do Farol Jornalismo (jura) embalada pela newsletter Canciones para despertar en Latinoamérica, que chegou hoje cedito com uma seleção do melhor do cancionero latino-americano. Assinem. É coisa fina.
Eu (MO), Lívia (LV) e Giuliander (GC) assinamos os tópicos.
Antes de começar, saibam o que é WebP e por que ele é essencial para os portais de conteúdo, no blog dos nossos parceiros da serverdo.in.
Semana passada, na NFJ…
Nosso agradecimento de <3 vai para:
Adriana Martorano Vieira, Alexandre Galante, Amaralina Machado Rodrigues Xavier, André Caramante, Andrei Rossetto, Ben Hur Demeneck, Bernardete Melo de Cruz, Bibiana Osório, Bruno Souza de Araujo, Diogo Rodrigues Pinheiro, Edimilson do Amaral Donini, Fabiana Moraes, FêCris Vasconcellos, Filipe Techera, Gabriela Favre, Guilherme Nagamine, João Vicente Ribas, Marcela Duarte, Marco Túlio Pires, Mateus Netzel, Monica de Sousa França, Nadia Leal, Pedro Luiz da Silveira Osório, Priscila dos Santos Pacheco, Rafael Paes Henriques, Roberto Nogueira Gerosa, Roberto Villar Belmonte, Rodrigo Ghedin, Rodrigo Muzell, Rogerio Christofoletti Rosental C Alves, Sérgio Lüdtke, Silvio Sodré, Taís Seibt, Vinicius Luiz Tondolo, Vitor Hugo Brandalise, Washington José de Souza Filho.
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❄️ Cobertura política em chamas I. Estava planejando desde a semana passada um bloco sobre como a imprensa cobriu a enxurrada de críticas ao Congresso feita pela esquerda nas redes sociais. Mas os acontecimentos políticos estão tão insanos que não temos como não falar também de Trump, taxações ao Brasil e regulação das Big Techs. Então respirem fundo e vamos lá. A derrubada pelo Congresso do decreto do governo de aumentar o IOF para quem investe mais de R$ 50 mil por mês, no último dia 26, gerou uma enorme reação da esquerda nas redes sociais – como, aliás, não se via há muito tempo. A pressão por justiça tributária, com críticas diretas ao Congresso, rendeu uma reportagem de mais de 6 minutos no Jornal Nacional, na quinta passada. Segundo esta matéria do Núcleo, o JN destacou que vídeos de IA a favor da taxação dos mais ricos estão “provocando preocupação de políticos e analistas e pedidos de moderação”. No ICL, Leandro Demori fez a crítica: “O JN levou ao ar uma reportagem que mais parecia um cordel escrito às pressas por um estagiário treinado nas fileiras do Brasil Paralelo. O telejornal chamou os memes de IA de ‘ataques’. Enfatizou que causam ‘polarização’ e levantam ‘preocupação de especialistas’, sem dizer quais e por que”. Diante da repercussão negativa da reportagem, a coluna Na Telinha, do UOL, informou que a Globo suspendeu a veiculação do material em outros programas. “A medida foi tomada porque a Globo foi surpreendida com a reação do público”, diz a matéria. Alguns dias antes, na Folha, Thiago Amparo já havia criticado a cobertura da imprensa sobre o caso IOF. Para ele, “no vale-tudo dos jornais – no qual o debate sobre taxação de super-ricos é traduzido como pauta antiCongresso e de polarização social –, sabe-se mais sobre quem almoçou com quem e quem ignorou a ligação de quem e menos sobre os interesses privados que sustentam a pouca ou nula taxação de super-ricos no país e como esses interesses interseccionam com os de parlamentares dispostos a sacrificar a estabilidade fiscal”. (LV)
Cobertura política em chamas II. Quando a mobilização nas redes ainda ecoava, e foi apropriada pelo governo em peças de comunicação que enfatizavam a luta de classes, começou no domingo, no Rio de Janeiro, a Cúpula do Brics. As movimentações e discursos tiveram ampla cobertura dos veículos até que, nesta quarta, Trump conseguiu unir a imprensa nacional e internacional após publicar uma carta ao presidente Lula com decisão de impor tarifa de 50% para todos os produtos brasileiros exportados para os EUA. Os três maiores jornais do país publicaram duros editoriais. “Coisa de mafiosos”, disse o Estadão. “Chantagem rasteira de Trump não passará”, manchetou a Folha em seu site. “Exigências estapafúrdias de Trump”, criticou O Globo. A imprensa internacional chamou a carta de “agressiva”, “retaliação”, “pessoal”, de acordo com esta matéria do G1, que compilou as repercussões no NY Times, WPost, BBC, Guardian, Clarín e Le Monde. Nas redes sociais, nova disputa discursiva, que a Folha reduziu a uma “disputa de hashtags”: “Enquanto um lado fala em ‘custo Bolsonaro’, o outro fala em custo ‘Lula/Moraes’ para justificar a decisão de Trump”, observou o jornal. Ontem, Lula deu entrevistas exclusivas ao JN e à Record, em que reafirma a posição do Brasil de não aceitar as inteferências de Trump que, além da promessa de taxação, criticou o tratamento dado pelo Judiciário brasileiro a Bolsonaro e a empresas de tecnologia americanas. Quero me concentrar nesse último ponto. Esta matéria da Folha avalia que a taxação de Trump foi impulsionada pelo recente julgamento no STF do Marco Civil da Internet. “Segundo três pessoas com acesso às discussões de eventuais sanções americanas ao ministro Alexandre de Moraes, a atuação do Supremo no caso foi vista como uma espécie de afronta ao aumentar a responsabilização das redes sociais”, diz o texto. Os leitores desta NFJ sabem há tempos o quanto as BigTechs têm se alinhado ideologicamente ao governo Trump e, agora, vemos da parte do presidente dos EUA uma defesa clara dos interesses das plataformas. O que ele chama de censura é a decisão do STF de obrigar as empresas a remover conteúdos criminosos proativamente. Hoje, Lula publicou artigo no Le Monde, El País, Guardian, Der Spiegel, Corriere della Sera, Yomiuri Shimbun, China Daily, Clarín e La Jornada, defendendo o multilateralismo. (LV)
❄️ Mais de 90% dos leitores vão embora quando batem em paywall. Talvez não seja uma grande novidade para quem trabalha em equipes de distribuição nas redações, mas um estudo (que reforça os interesses comerciais) da Make It Free mostra que mais de 90% dos leitores deixam um site quando encontram um paywall. Isso ocorre apesar da sofisticação dos sistemas atuais cujos algoritmos apresentam um dinamismo maior do que os do passado (ou seja, tentam convencer o leitor interessado a pagar por uma assinatura oferecendo conteúdos personalizados). “Os publishers se habituaram a aceitar que 90% de sua audiência sempre será ‘receita perdida’. Esta pesquisa mostra que essa suposição está incorreta”, disse Wade Bradley, CEO e cofundador da empresa. Segundo ele, essa parte enorme da audiência está, na verdade, completamente fora de alcance porque eles são os chamados “leitores sem intenção”, que não têm qualquer interesse em pagar ou compartilhar dados com uma publicação. De acordo com o relatório, a introdução de paywalls inteligentes — aqueles algoritmos que avaliam a intenção do usuário e personalizam as ofertas — melhorou as taxas de conversão apenas entre usuários com alta intenção de compra. As médias do setor mostram que cerca de 7% dos leitores se cadastram para contas gratuitas e cerca de 3% compram assinaturas quando solicitados. Mas o resto foge. E o estudo alerta que nenhum aprimoramento nos paywalls de back-end provavelmente mudará esse comportamento arraigado que os autores comparam com o da maioria absoluta dos transeuntes que, no passado, passavam pelas bancas de revistas e jornais sem parar para comprar uma edição completa - no máximo, davam uma paradinha para ver as manchetes das capas. Sem muitas surpresas, o estudo alerta para os perigos da intermediação de plataformas entre os leitores e os publishers. “Quando você não permite um engajamento amplo, você não controla o relacionamento com as massas. Essa é a lição de todos os sistemas fechados, sejam eles sites, livros de música e revistas, nas últimas duas décadas”, disse Bradley. O relatório ressalta que a construção de conexões diretas não precisa depender apenas de assinaturas pagas. Ele recomenda abordagens incrementais para coletar informações do usuário em troca de valor — seja por meio de newsletters, acesso gratuito limitado ou outras formas de engajamento. No mais, as conclusões mais interessantes do relatório são as seguintes:
Consumidores que encontram menos barreiras para experimentar conteúdo têm uma probabilidade significativamente maior de retornar;
Práticas transparentes de dados e limites claros em relação à privacidade aumentam a confiança e o engajamento futuro;
Mesmo pequenos incentivos, como conteúdo exclusivo por e-mail ou recompensas, podem mudar significativamente o comportamento do usuário ao longo do tempo. (GC)
❄️ Roadmap para se atualizar em IA. Faz cerca de 2 anos e meio que a avalanche da inteligência artificial começou a se mover montanha abaixo rumo à cidadela dos jornalistas lá embaixo, no vale. Quando o ChatGPT completou 1 ano, publicamos um guia com “O mínimo que um jornalista precisa(va) saber sobre inteligência artificial para começar 2024”. Nosso trabalhinho não envelheceu mal, mas agora o diretor de IA do Der Spiegel, Ole Reissmann, sugeriu um breve e imperdível roadmap para nos atualizarmos ou mesmo começarmos a nos aprofundar no assunto a essa altura do campeonato, quando a aniquilação do vilarejo chamado Jornalismo já parece impossível de evitar. São basicamente 12 passos que sintetizamos abaixo:
Ler o livro “Cointeligência: A vida e o trabalho com IA”, de Ethan Mollick, recém publicado em português pela Intrínseca, além de se inscrever na newsletter do autor e segui-lo no LinkedIn;
Conferir quais são algumas das melhores ferramentas e produtos com IA que já estão à disposição. Kalle Pirhonen listou 90 e Sergey Yakupov, mais de 100.
Ler o relatório da European Broadcasting Union (EBU) com casos de uso e Q&A's;
Obter experiência prática e começar a imersão na IA para o jornalismo. Pode começar com esse formulário que ajuda os jornalistas a decidirem que ferramenta usar para um projeto específico;
Acompanhar o Generative AI In The Newsroom, blog fundado por Nick Diakopoulos no seio do Computational Journalism Lab da Universidade NorthWestern;
Ouvir o podcast Newsroom Robots de Nikita Roy;
Assistir às gravações das mesas do Nordic AI in Media Summit no YouTube;
Participar de redes de trocas de informações sobre o uso da IA no jornalismo. Ele cita duas fechadas para membros da INMA e da WAN-IFRA e uma outra na Alemanha. Será que existe algo parecido no Brasil?
Aprender mais sobre o conceito de “conteúdo líquido”;
Encontrar mais especialistas no assunto para seguir. Aqui está uma lista com 86;
Aplicar para o CUNY AI Journalism Lab.
Boa sorte! (GC)
❄️ O problema da confiança. Artigo sintético e interessante de Aida Alami na CJR sobre o problema de confiança do jornalismo. O texto começa citando dados recentes do DNR e do Pew Research Center sobre a queda (ou manuntenção em baixos índices) da confiança das pessoas na mídia e a emergência de influenciadores como preferência de uma parte crescente do público para se informar. Em seguida, Alami afirma que esse não é um fenômeno novo, lembrando que em 1846 a AP “introduziu a ética da objetividade como alternativa à cobertura politicamente partidária”, e que as disponibilidades de informações sobre eventos recentes (invasão do Iraque em 2003, Primavera Árabe, Black Lives Matter, Gaza) fora das mídias tradicionais deram vida nova à percepção de que a narrativa da imprensa sempre foi enviesada. “A imprensa nunca se recuperou verdadeiramente do colapso moral e profissional em torno da invasão do Iraque — essa traição persiste”, disse Aboubakr Jamaï, jornalista e reitor da Escola de Relações Globais Donna Dillon Manning, em Madri, à Alami. Interessante observar como a cobertura da invasão do Iraque, em 2003, é um divisor de águas para o jornalismo moderno norte-americano. Qual seria a nossa cobertura equivalente? Junho de 2013, talvez? Se em 2003 o público tinha os blogs para buscarem informações alternativas às veiculadas pela imprensa tradicional – cooptada pelo “patriotismo” da era Bush –, as redes sociais turbinaram a vontade das pessoas tentarem encontrar a verdade. Alami ouviu Benjamin Moser sobre o tema. Para o vencedor do Prêmio Pulitzer, “a frustração com as empresas de mídia decorre, em parte, do cansaço do público com o que ele chama de ‘falsa objetividade’ dos veículos”. Ele cita a maneira como o jornalismo usa a linguagem: ou ofusca algo deliberadamente ou tenta empurrar algo que não condiz de fato com o que está acontecendo. Por outro lado, entre as vozes alternativas – tanto à esquerda quanto à direita – Moser diz observar “uma sensibilidade comum, marcada por desafio e ênfase na transparência”. O vencedor do Pulitzer não acredita muito que o jornalismo tradicional possa virar o jogo. "O jornalismo está em uma crise profunda da qual não acredito que vá se recuperar", afirmou. "O que eu acho que vai emergir são os indivíduos", disse ele à Alami, fazendo referência à importância da reportagem. "O que vamos perder é o jornalismo como um pacote” – e aí voltaremos ao século XIX. Ou ao neopublicismo, como citado na news da semana passada. (MO)
💎 Jornalismo zero: acordos de licenciamento. Seguimos com a análise do relatório do Tow Center sobre a relação do jornalismo com a IA. Começamos a ler o report Journalism Zero: How Platforms and Publishers are Navigating AI na edição #510, quando falamos sobre as atitudes dos entrevistados em relação à utilidade da IA generativa. Depois, seguimos na #511 e na #512, quando os tópicos foram, respectivamente, experimentação e implantação de soluções baseadas em IA generativa nas redações e as conversas entre publishers e plataformas de IA (ou a inexistência delas). Na semana passada, na NFJ#515, (depois de uma pausa para abordar o DNR), falamos sobre tráfego, bloqueio de crawlers e dados da audiência. Hoje é a vez de abordarmos os acordos de licenciamento. A leitura termina na semana que vem.
Apoiadores seguem conosco. (MO)
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