Jornalismo deve aprender a noticiar a crise climática para além do acontecimento
Nona edição do projeto realizado pelo Farol Jornalismo e pela Abraji indica que, em 2025, a cobertura do clima vai precisar aprofundar enquadramentos, sem se deixar seduzir pela neutralidade
Em 2024, o jornalismo foi obrigado a incorporar a catástrofe climática transversalmente em suas coberturas. A enchentes no Rio Grande do Sul e a seca e os incêndios nos estados do norte, entre outros eventos extremos, levaram a crise do clima às manchetes de todas as editorias
Em 2025, o jornalismo deve aprender a noticiar a crise climáticas olhando não só para um acontecimento que rompe com a normalidade. Para dar às pessoas a real dimensão do que está acontecendo com o planeta, vamos precisar aprofundar enquadramentos, relacionando causas e consequências. Mais do que dar contexto, não se deixar seduzir pela neutralidade no momento em que é a vida na/da Terra que está em jogo.
É urgente dar mais voz aos povos originários. Lado a lado com os guardiões da floresta, os comunicadores indígenas trazem na sua origem algo que o jornalismo – como filho da modernidade que é – não possui: a compreensão de que somos a própria natureza. O conhecimento e a atuação desses profissionais serão decisivos para alçar os saberes indígenas aos principais fóruns de discussão sobre o clima, como as COPs. Ao jornalismo cabe incorporar e amplificar esses discursos. Mas não pela perspectiva da excentricidade, e sim pela necessidade de oxigenar a busca por soluções para um problema tão complexo.
Trata-se de uma mudança significativa no campo jornalístico – materializada atualmente em veículos como Amazônia Real e Sumaúma. Porque implica em não apenas sublinhar a importância de determinados assuntos, mas transformar a maneira como o meio ambiente é abordado em nossas notícias e reportagens.
A crise narrativa, aliás, transborda a cobertura sobre o clima.
Reportar a expansão das religiões evangélicas a partir de uma abordagem política e social, em vez da conotação preconceituosa e reducionista que costuma marcar essas pautas, também segue um desafio para o jornalismo brasileiro. No ano que vem, com a liberação de mais dados do censo de 2022, o jornalismo terá uma nova oportunidade para aperfeiçoar a abordagem a esse fenômeno, especialmente sob o ponto de vista político.
Outro desafio que se apresenta frente à estafa da audiência nem relação às notícias é tornar o conteúdo jornalístico mais atraente.
Talvez os influenciadores possam ajudar. A consolidação da atividade, especialmente entre os jovens, coloca em xeque a técnica narrativa que busca a imparcialidade como um dos pilares da credibilidade e expõe a fragilidade do nosso vínculo com o público. Em 2025, será preciso entender qual é a aproximação possível entre jornalismo e influência digital. A autenticidade é um dos principais ativos dos influenciadores, mas como fazê-la dialogar com princípios jornalísticos fundamentais, como a objetividade?
Bom lembrar que objetividade não é sinônimo de distanciamento. Cinco anos após a pandemia afetar os processos jornalísticos ao impor a virtualização das relações como padrão, em 2025, o jornalismo precisará voltar a sublinhar a importância do território. Nas periferias, essa é a regra. Tal como agentes comunitários de saúde, jornalistas periféricos atuam como mediadores entre as pessoas e os fatos, reafirmando a importância da proximidade, inclusive como forma de reestabelecer a confiança do público.
Via de regra, o resultado desse vínculo é um jornalismo que se transforma em um bem para as comunidades. E a oferta do que é de interesse de todos não pode estar regida apenas por interesses comerciais ou pela lei da oferta e da procura. A questão é: como financiar o jornalismo de interesse público? A pergunta não é nova, mas à medida que entendemos o lugar da nossa atividade na sociedade atual, surgem novas possíveis respostas. Uma delas é o jornalismo sem fins lucrativos. No próximo ano veremos ganhar força, no Brasil, discussões a respeito dessa forma de organização.
O jornalismo que prioriza a humanidade também precisa pautar as discussões a respeito da inteligência artificial. Até porque, em 2025, devemos observar o avanço de uma nova onda de plataformização a partir da adoção massiva das ferramentas oferecidas pelas big techs. Isso não pode significar, no entanto, passividade em relação à massificação dos modelos de IA generativas. O desafio será duplo. Será preciso lutar para que a inteligência artificial esteja a serviço do jornalismo, e não o contrário. Mas antes será necessário entender como, até porque a IA coloca em xeque muitas dimensões do que conhecemos como jornalismo.
Fato é que a IA veio para ficar, e por ora vem gerando mais ansiedade do que ganhos de produtividade. Ansiedade pelo medo de demissão e pela necessidade de aprender mais uma tecnologia em ascensão em meio a uma rotina de trabalho cada vez mais precarizada. O impacto evidente é na saúde mental dos profissionais, tema que precisará estar no centro das discussões no ano que vem, especialmente sob o ponto de vista institucional.
O fortalecimento das instituições de classe também deve ser uma aposta do jornalismo contra o recrudescimento dos assédios judiciais. Processos como forma de intimidação e censura vão seguir fazendo parte da realidade profissional em 2025. Mas o fortalecimento da atuação de organizações como Abraji e Media Defense oferecerá proteção aos jornalistas e intensificará a luta pelo livre exercício profissional e pela liberdade de imprensa.
Todas essas questões estão contempladas nas projeções assinadas pelos 10 autores e autoras convidados por Farol Jornalismo e Abraji para esta edição d’O jornalismo no Brasil, especial que há nove anos reúne jornalistas e pesquisadores para refletirem sobre o que esperar do jornalismo no ano que se aproxima.
As projeções para 2025 são de Amanda Miranda, Bibiana Maia, Elane Gomes, Elizabeth Saad, Eloisa Loose, Izabela Moi, Juliana Albuquerque (em nome da Rede Wayuri), Mariana Alvim, Moisés Costa Pinto, Thiago Borges.
Leia e reflita sobre a ideias de cada um deles. Compartilhe com amigos e colegas. Vamos pensar juntos o jornalismo de 2025!
Este texto faz parte da série O Jornalismo no Brasil em 2025.